Zoológicos de Lisboa e do Rio de Janeiro: exemplos para a criação de um zoo em São Paulo no século 19

Este é um trecho da dissertação de mestrado “Rastros: A Constituição do Zoológico de São Paulo na Imprensa Paulistana”, defendida na Universidade Estadual de Campinas em 2015 por Luísa Pessoa.


Não encontramos registros do século XIX que apontassem a existência, mesmo que amadora, de uma área pública voltada à exposição de animais na cidade São Paulo[1]. No entanto, algumas notas publicadas em jornais no período deixam transparecer o desejo (e a cobrança) de criação de uma coleção zoológica em praças e parques da cidade:

O jardim da Luz é botanico, ou zoologico?

Se é zoologico deve ter toda a casta de insectos assim como cavallos e burros, e pasto para todos estes indivíduos…Ora, ali não ha pasto (salvo se os bancos de relva pódem supprir esta falta); logo é botanico.

Ora, se é botanico deve ter flores para os animaes comerem e cheirarem. (grifos no original, Diario de S.Paulo, 21 fev. 1866)

Em 1880, José Luciano Barbosa[2]  doou para o jardim público da cidade (atual Jardim da Luz), por meio de A.B. Quartim[3] “duas avez aquáticas muito bonitas, que vão ser as primeiras habitantes do lago, e seu vistoso ornamento” (A Província de São Paulo, 4 jan. 1880). O jornal sinalizou a esperança de que a doação fosse o início de um empreendimento colecionista mais ambicioso: “As duas avez enviadas ao passeio valem egualmente a indicação de que alli desde já seria possível ir formando alguma cousa que tivesse ares de um jardim zoologico”.

A pequena coleção pareceu ter alcançado algum sucesso[4]. Tanto é que, em 1884, a imprensa denunciou atos de “vandalismo” contra os pássaros dali, como quebra de asas e corte de pernas:

Os selvagens que praticam aqueles brutaes gracejos sabem esconder-se, e apenas o que não conseguem é deixar de provar que ainda são abundantes em nossa população os typos que representam a triste e atrazada civilisação desta santa terra bragantina (A Província de São Paulo, 2 mai. 1884, grifo do autor).

A ideia de que somente uma cidade em progresso e cujo povo tivesse civilidade reunia as condições necessárias para conservar e fazer prosperar um zoológico viria à tona em diversos momentos.

Ainda assim, é preciso entender por que ocorria a defesa da construção de um zoo em São Paulo. Mais do que isso, o que se entendia e se esperava de um zoológico quando se advogava por um. Uma hipótese é que a imprensa paulistana –representando, bem como se dirigindo às camadas letradas– construiu a concepção dessa instituição (e sua importância), entre outras influências, ao acompanhar os sucessos e fracassos de outras cidades –no caso, do Rio de Janeiro e de Lisboa– na elaboração e na concretização de seus próprios projetos. Ou seja, alguns dos argumentos que apareceriam em debates na imprensa sobre a necessidade (ou inutilidade) de construção de um zoo em São Paulo foram elaborados em contraste a esses dois casos citados.

Com o sugestivo título “Lição que nos serve”, Ramalho Ortigão[5] escreveu para A Província de S.Paulo, em abril de 1883, um extenso elogio à comissão formada para a construção de um zoológico na capital portuguesa. O argumento do autor é interessante por defender o caráter recreativo do zoológico como porta de entrada para a “curiosidade intellectual” da população. Assim, ainda que o zoológico pudesse ser planejado apenas para fins lúdicos, para Ortigão, inevitavelmente ele também traria importantes melhoramentos “intelectuais e morais” para o povo. Um resultado que, para o escritor, era até mesmo mais importante do que o uso dos zoológicos para “estudos da biologia e da zoologia comparada” por especialistas:

A sabida importância de um jardim zoologico para os altos estudos da biologia e da zoologia comparada, as quaes, depois de Darwin, se tornaram a base experimental de toda a philosophia da natureza, torna-se um valor secundario perante os estímulos de curiosidade intellectual e de moralisador e nobilitante prazer intelligente, que essa instituição é chamada a exercer no espírito do povo (Ramalho Ortigão, A Província de São Paulo, 4 abr. 1883, grifo nosso).

Ortigão defendeu esse argumento listando exemplos de instituições formais de ensino construídas pelo governo português que fracassaram ao não conseguir convencer e seduzir a população para sua importância instrutiva. “O povo não sente a necessidade de aprender”, explicou. Assim, o zoo seria importante por fazer uma ponte entre o prazer e o aprendizado intelectual:

A instrução fecunda para um povo não é a que os governos lhe abonam, mas sim a que elle de per si mesmo solicita (…) A curiosidade intellectual não desperta sinão pelo exercício das faculdades postas em movimento por uma solicitação de prazer, e ninguém entre nós tem pensando em crear os prazeres do espírito popular (Ramalho Ortigão, A Província de São Paulo, 4 abr. 1883).

Mais do que proporcionar o avanço intelectual de uma população ansiosa por diversão, a existência de um zoo na capital portuguesa também responderia, segundo o jornalista, a uma tendência observada em outras “capitaes da Europa”, que já tinham construído seus próprios zoos e que concretizavam um ideal de civilidade e urbanidade que pequenas e médias cidades, tais como São Paulo, aspiravam um dia alcançar.

O zoológico de Lisboa abriu suas portas no dia 29 de maio de 1884, no parque S. Sebastião da Pedreira. A inauguração foi vista, antes de tudo, como um avanço civilizatório: “Hein! Isto representa inquestionavelmente mais uma conquista que a civilização alcançou sobre a inercia ignorante e rotineira d’esta Lisboa”, celebrava a Província de São Paulo em 19 de junho de 1884[6].

As reportagens da época eram otimistas quanto ao futuro do zoo. Já na inauguração, que contou com a presença da família real (dom Luiz, dom Fernando e dom Augusto), 2.500 pessoas visitaram o local (Província de São Paulo, 19 jun. 1884), que expunha bois de diferentes raças, ovelhas, cães (Província de São Paulo, 23 jun. 1884), “boa variedade de aves, um bando apreciavel de macacos, e conjunctamente –excentricidade para um amador, si o houvesse–, algumas feras: por exemplo, dous ursos e um lobo, alguns javalis e javardos”. Os preferidos do público pareciam ser “dous camellos [que] vão já fazendo as delícias das crianças, deixando-se montar com uma passividade melancolica” (A Província de São Paulo, 19 jun. 1884).

O trecho sobre os camelos chama a atenção. Em primeiro lugar, nele subentende-se que o empreendimento zoológico da época não era apenas a satisfação do olhar, mas, sim, a satisfação de outros sentidos, como o toque. As pessoas podiam encostar nos animais e mesmo, como diz o trecho, montá-los. Outra descrição do mesmo dia, e sobre os mesmos animais, confirma: “No meio do pinhal estavam os camellos; o macho andava apparelhando com uma cadeirinha dupla, sobre um xairel de velludo carmesim, com franjas” (A Província de São Paulo[7], 23 jun. 1884).

Não é um episódio isolado. Diversas fotografias de zoológicos dos séculos XIX e início dos XX representam os animais tendo contato direto com os visitantes[8].

Em segundo lugar, é interessante notar a observação de que os camelos tinham um comportamento passivo e melancólico. Mesmo a movimentação nas jaulas dos primatas no zoo de Lisboa não foi vista como simples expressão de alegria. A hilaridade é dos visitantes, não dos macacos, que brigam entre si e correm uns sobre os outros:

O que mais chamava a attenção do público eram as gaiolas dos macacos. A principal, bastante alta, tem grande quantidade daquelles animaes que estão em constantes momices, saltando dos troncos das árvores para os trapezios e argollas, correndo uns sobre os outros em engraçadas luctas e provocando pelos seus tregeitos a hilariedade dos visitantes (A Província de São Paulo, 23 jun. 1884).

Como veremos em outros casos, no segundo capítulo, quando os autores (raramente) se expressavam sobre os sentimentos dos animais no zoológico, estes sempre eram percebidos não pela alegria, mas pela melancolia, pela raiva e pela nostalgia.

Apesar dessas observações negativas, parecia existir a crença de que um bom planejamento e uma boa disposição de jaulas seriam suficientes para suprir o desgosto dos animais. Ainda sobre o zoo de Lisboa, pontuou-se, por exemplo: “O local é magnifico, e n’aquelle vasto recinto todo coberto de arvoredos (…), os pobres animaes prisioneiros não terão ao menos a nostalgia da verdura e da sombra” (A Província de São Paulo, 19 jun. 1884).

Ainda que o novo empreendimento tenha sido saudado, ele não prosperou. Pouco mais de um ano após a inauguração, em novembro de 1884, A Província de S.Paulo já criticava o zoológico de Lisboa pela “absoluta deficiência de specimens zoológicos, não havendo alli em exposição completa uma só família animal” (C.V., A Província de São Paulo, 18 nov. 1884)[9]. Em junho de 1885, o jornalista Carrilho Videira fez uma dura crítica, acrescentando à falta de diversidade de animais o despreparo para resguardar a coleção do inverno e as jaulas “acanhadas”:

Uma girafa que alli havia morreu, bem como outros animaes, ignaramente sacrificados, durante a quadra dos grandes frios, em acanhadissimos espaços. As jaulas dos cães e demais animaes são extremamente acanhadas, algumas têm apenas um metro de largura e tres de fundo, o que enregela o animal e o mata, por não poder mover-se à vontade e harmonizar a circulação necessária (Carrilho Videira, A Província de São Paulo, 10 jun. 1885).

O fracasso do zoológico, para o jornal, poderia ser demonstrado pela queda do número de seus visitantes. Nos seis primeiros meses de 1885, a média foi de 602 entradas por dia; no ano anterior, de 770 (A Província de São Paulo, 5 set. 1885).

Em dezembro de 1885, reportou-se que a falta de “capacidade administrativa e intelectual” da “burguezia argentária da capital” de Lisboa responsável pelo zoo havia levado a um pedido de subsídio ao governo. Tal fracasso, o jornal explicou, deu-se exatamente por seus criadores terem feito do parque mais um espaço lúdico do que um lugar que respondesse ao “fim real” da instituição: “Pretenderam transformar aquelle esplendido parque, verdadeiro jardim de acclimação, em circo de arlequins, palhaçadas e comesainas, porque para o fim real da instituição não tinham capacidade de o adaptar” (A Província de São Paulo, 19 dez. 1885). Apesar de fazer a crítica, o artigo não respondia qual era então a finalidade “real” do zoo, embora se possa deduzir, a partir do comentário feito dois anos antes por Ramalho Ortigão, de que seria a instrução do povo.

Em 1887, como resultado direto da “incapacidade dos directores”, parecia iminente o fechamento do zoológico de Lisboa:

[A] imprensa clama que os animaes morrem de fome, agoniando os visitantes que ainda entram alli.

Desde que vimos à frente de tão brilhante empreza uns nomes de enfatuados e fatuos capitalistas e doutores, desde que vimos o rumo que tomavam os trabalhos que realisavam no formoso parque e jardim, edificando casinholas bonitas, sem commodidades para os animais a que os destinavam, concluimos que ia morrer esta tão útil empresa; que o publico tão bisarramente coadjuvou, em quanto não viu desvarios.

Os jornaes que dantes elogiavam estes já agora se lamuriam e censuram o que tem ocorrido (Carrilho Videira, A Província de São Paulo, 30 jan. 1887).

O zoo lisboeta não chegou a fechar suas portas nessa época, como é possível descobrir por outras fontes. No entanto, o caso lisboeta figura como um exemplo de fracasso acompanhado de perto pela imprensa paulistana. As consequências e influências do episódio podem ser difíceis de delinear. No entanto, é prudente crer que tenham existido. O mesmo no caso do zoológico do Rio de Janeiro, que enfrentou outra sorte de problemas, mas nem por isso, também, teve suas atividades encerradas.

Em 1874, o Diário de S.Paulo publicou um ofício em defesa da construção de um zoológico no Rio de Janeiro, voltado ao lazer dos homens e ao estudo dos animais, que pudesse equiparar a capital a outras “cidades das nações civilizadas”. A autoria do documento era de José Fernandes da Costa Pereira Júnior (também conhecido como Visconde do Bom-Retiro), presidente do Imperial Instituto Fluminense de Agricultura. O texto tinha como destino o Ministério da Agricultura.

No ofício, o Visconde do Bom-Retiro defendia um zoológico não com animais estrangeiros, que necessitariam ser aclimatados ao clima brasileiro, mas “antes um lugar de exposição, criação e tratamento de animaes de nossas florestas, que ali possão ser vistos e facilmente estudados, e servirem ao mesmo tempo de (sic) augmentar o recreio publico, que hoje presta o Jardim Botanico” (Luiz Pedreira do Couto Ferraz, Diario de S.Paulo, 6 set. 1874, grifo nosso). Dessa forma, argumentava o visconde, não haveria altos custos para a compra de animais (já que, ele explicava, muitos haviam sido oferecidos de graça para o empreendimento) nem para a manutenção do parque em si, que poderia contar com a renda de serviços oferecidos dentro do próprio zoo.

É isto o que mais me anima na insistencia que faço a respeito deste assumpto, por me parecer que é tempo de irmos realizando este e outros melhoramentos de semelhante genero, de que ha tantos annos gozão não só as grandes capitaes, mas até pequenas cidades das nações civilisadas, que aliás não dispoem dos elementos que tem o Brasil (Luiz Pedreira do Couto Ferraz,  Diario de S.Paulo, 6 set. 1874, grifo nosso).

Não só Pereira Júnior sonhava com um zoo carioca. Em dezembro de 1882, a Companhia Villa Isabel[10], propriedade do comendador João Batista Viana Drummond, demonstrou interesse em construir uma avenida, um “palácio permanente de exposição” e um jardim zoológico “entre Villa Isabel e o princípio da rua do Senador Eusebio” (A Província de São Paulo, 30 dez. 1882).

Em agosto de 1884, segundo Magalhães (2011), aconteceu a primeira consulta à Câmara Municipal da Corte do Rio de Janeiro para a fundação do zoo por parte de Drummond, que já então, com perspicácia empresarial, pedia a isenção de impostos por prazo indeterminado para o empreendimento e o bloqueio, por 30 anos, de quaisquer outros zoológicos concorrentes (Magalhães, 2011:24-25).

A construção do zoo foi autorizada em poucas semanas, com uma pequena modificação do tempo de monopólio do parque, de 30 anos para 25 anos (Magalhães, 2011:27). Magalhães lista algumas das cláusulas contratuais acordadas entre Drummond e a Câmara Municipal do Rio de Janeiro, entre as quais estava a obrigação (1) de que os animais deveriam ser distribuídos no zoo “de acordo com a melhor classificação, guardando no tratamento as prescrições higiênicas aconselhadas pela ciência” e (2) de que deveria ser adquirido o maior número de espécies animais possível, “principalmente daquelas raras e estranhas ao país, de modo a que o estabelecimento possa competir com os melhores desse gênero” (2011:27).

A Província de São Paulo noticiou a autorização para a construção do zoológico de Vila Isabel em outubro de 1884 (A Província de São Paulo, 26 out. 1884). Neste ponto, temos algumas pistas sobre como o pedido feito pelo Visconde de Bom Retiro, dez anos antes, havia sido respondido. Ao permitir que Drummond construísse um zoológico na cidade, o governo impôs uma condição: “Esta clausula não obstará a fundação do jardim zoológico que o Imperial Instituto Fluminense de Agricultura projecta, nem dos que para o futuro outras instituições semelhantes ou o Estado pretenderem estabelecer” (A Província de São Paulo, 26 out. 1884). Esta ressalva foi a única mencionada pelo jornal, que silenciou sobre os outros pontos do contrato.

Poucos meses depois, o jornal O Paiz divulgou mais detalhes sobre a planta do zoo planejado por Drummond. Segundo a nota, o terreno do parque teria as seguintes dimensões: 450 m (rua do Bom Retiro)[11]  X 440 m (rua Santa Izabel[12]) X 682 m X 684 m e conteria

rios, lagos, aquariums, bosques, pontes e cascatas; terá edifícios apropriados para aves, animaes quadrupedes e reptis, notando-se entre outras, cujos perfis ainda não estão levantados, as vivendas dos macacos, duas casas para animais pacificos, um pombal, viveiros de passaros, aves, jaula para ursos e para animaes ferozes, casas para veados, para faizões, e diversas outras (A Província de São Paulo [reproduzindo artigo do jornal O Paiz], 11 jan. 1885).

O jornal fez imenso elogio ao criador da ideia, João Drummond:

Este novo e importante melhoramento para a nossa população, que tanto procura e frequenta os arrabaldes da cidade na estação calmosa, é devido a iniciativa do sr. commendador João Baptista Vianna Drumond, presidente da companhia ferro-carril Villa Izabel, o qual ha muito tempo se desvela pelo estabelecimento de tão útil jardim, que ao mesmo tempo servirá para estudo e para recreio (A Província de São Paulo [reproduzindo artigo do jornal O Paiz], 11 jan. 1885).

Em julho de 1888, ocorreu a inauguração oficial do zoológico (Magalhães, 2011:30), que prosperou expondo animais que surpreendiam por, como os camelos de Lisboa, ter caráter quase “circense”. Tal se vê claramente pela divulgação na imprensa da morte de Bosco, elefante comprado de um circo (Companhia Irmãos Carlo) pelo zoo e conhecido por ser bem adestrado, tocando música e trabalhando “por cima das garrafas” (Correio Paulistano, 20 ago. 1893).

Ainda segundo Magalhães (2011:29), os animais do zoológico do barão de Drummond eram classificados seguindo a divisão ferozes e pacíficos: “A jaula para os ferozes seria construída com pedra, cal e barras de ferro, sendo os pacíficos ‘convenientemente guardados’”. Essa divisão pode corresponder a uma divisão entre selvagens e domésticos. Com o passar dos anos, os zoológicos parecem ter se concentrado somente na categoria de ‘selvagens’, provavelmente por seu maior apelo ao público. Já o doméstico só comparecerá quando anômalo, caso da vaca de sete pernas do jardim da Aclimação, como veremos em um próximo capítulo.

A prosperidade do zoo do Rio de Janeiro, no entanto, logo foi minada pela criação de um divertimento popular que desmentia o caráter higienizador e educativo do empreendimento: o jogo do bicho. Antes de abordar esse assunto, no entanto, examinaremos as tentativas malogradas do estabelecimento de zoológicos privados em São Paulo no período.


Notas:

[1]Emerlinda Pataca (2006:270-272) menciona o que parece ser a primeira coleção de animais no Brasil, no Rio de Janeiro. Criada em 1784 por Luís de Vasconcelos e Sousa, a Casa de História Natural, popularmente conhecida como Casa dos Pássaros, abrigava e preparava para as longas e insalubres viagens ultramarinas os animais, principalmente aves, destinados à realeza de Portugal. Localizado no Passeio Público, no aterro da Lagoa do Boqueirão, o espaço ficava sob o comando de Francisco Xavier Cardoso, também conhecido como Xavier dos Pássaros. Há também relatos na imprensa sobre um zoológico pertencente à Corte brasileira, no Rio de Janeiro, desde 1888:           

Está no Jardim Zoologico da côrte e foi apanhada ha poucos dias nas mattas de Villa Isabel uma grande cobra que mede dous metros de comprimento e tem um grande papo. Pessoas competentes não sabem a que familia de ophidios pertence esse reptil, tão differentes são as suas fórmas. É um animal raro e que deve ser estudado pelos entendidos (Correio Paulistano, 28 dez. 1888, grifo nosso).     

Uma reportagem de 1965 sobre a ilha de Guanabara (O Estado de S. Paulo, 22 out. 1965) também menciona a existência de uma pequena coleção de animais organizada pela imperatriz Leopoldina depois da Independência do Brasil.      

O historiador Felipe Magalhães (2011:22) menciona um zoológico no Rio de Janeiro, na década de 1860, de propriedade de um comerciante português:

Na década de 1860, José Antonio Alves Souto teria organizado um jardim zoológico em sua chácara localizada na rua Monte Alegre, quase na esquina com a rua do Riachuelo (Gerson, 2000:333). De acordo com Renascença, “o Souto” seria um negociante português que com muito trabalho teria conseguido fazer fortuna no Brasil. Tendo construído um “belo palacete” no endereço acima, decidiu organizar nos terrenos de sua propriedade um jardim zoológico. Lá teria reunido “muitas e variadas espécies, dos mais interessantes animais do globo”, inclusive um elefante (Magalhães, 2011:22).

[2]Provável membro da elite paulistana, já que aparece como um dos diretores de um incipiente museu provincial em São Paulo em 1877, que mais tarde foi extinto (Moraes, 2009:sp).

[3]Antônio Bernardo Quartim (1822-1888) trabalhou na construção de diversas obras públicas na cidade e na administração do Jardim Público (Campos, 2008:sp).

[4]Dirá o jornal: “Desde o tempo da administração do sr. Laurindo de Brito, o jardim publico tomou uns certos tons de jardim zoologico, sendo aproveitado o tanque central para a aclimação de jaburús, saracuras, gansos marrecos, etc.” (A Província de São Paulo, 2 mai. 1884).

[5]José Duarte Ramalho Ortigão, jornalista e escritor português, foi colaborador de diversos jornais.

[6] Este texto parece ter sido escrito por um correspondente do jornal em Lisboa, talvez até mesmo Ramalho Ortigão.

[7] Trata-se da reprodução de uma reportagem do jornal lisboeta Seculo, datada de 29 de maio de 1884.

[8] Hoje a prática ainda existe em alguns locais, mas é condenada e alvo de denúncias, caso do zoológico de Luján, em Buenos Aires, suspeito de dopar animais, principalmente os felinos, para que visitantes tirem fotos com eles (Bloom, 2014).

[9]O jornal só assina com as iniciais do correspondente, mas provavelmente se trata de Carrilho Videira, como poderá ser deduzido a partir de outros textos, desta vez assinados.

[10]Companhia de Ferro Carril de Villa Isabel, que prestava serviços de transporte de bonde na então capital federal do Brasil (Gazetinha, 24 fev. 1882). A perspicácia empresarial de Drummond é ressaltada pelos autores que estudaram sua trajetória, segundo Magalhães (2011). Um exemplo: para se chegar ao zoológico de Vila Isabel, era necessário tomar como transporte os bondes da companhia do empresário.

[11]Provavelmente a atual rua Barão do Bom Retiro.

[12]Provavelmente a atual rua Visconde de Santa Isabel.


Bibliografia